quinta-feira, 20 de setembro de 2012


Álvares de Azevedo: LEMBRANÇAS DE MORRER “

LEMBRANÇAS DE MORRER

 “...Eu deixo a vida como deixa o tédio
 Do deserto, o poento caminheiro,
 - Como as horas de um longo pesadelo
 Que se desfaz ao dobre de um sineiro;
 Como o desterro de minh’alma errante,
 Onde fogo insensato a consumia:
 Só levo uma saudade - é desses tempos
 Que amorosa ilusão embelecia.
 Só levo uma saudade - é dessas sombras
 Que eu sentia velar nas noites minhas.
 De ti, ó minha mãe, pobre coitada,
 Que por minha tristeza te definhas!
 Se uma lágrima as pálpebras me inunda,
 Se um suspiro nos seios treme ainda,
 É pela virgem que sonhei. que nunca
 Aos lábios me encostou a face linda!
 Só tu à mocidade sonhadora
 Do pálido poeta deste flores.
 Se viveu, foi por ti! e de esperança
 De na vida gozar de teus amores.
 Beijarei a verdade santa e nua,
 Verei cristalizar-se o sonho amigo.
 Ó minha virgem dos errantes sonhos,
 Filha do céu, eu vou amar contigo!
 Descansem o meu leito solitário
 Na floresta dos homens esquecida,
 À sombra de uma cruz, e escrevam nela:
 Foi poeta - sonhou - e amou na vida...”